sábado, 4 de fevereiro de 2012

A rara vitória da paz

Por Guilherme Uchoa

“Só o santos parou a guerra/ com Rei Pelé, Bi-Mundial/ O maior time da terra!” as estrofes da música comumente cantada por torcedores de uma das organizadas santistas, remetem a um dos momentos mais místicos e históricos dos quase 100 anos de existência do Santos Futebol Clube: o dia em que a guerra civil nigeriana parou para ver o time da Vila jogar.


Para ser mais preciso, em 4 de fevereiro de 1969, 43 anos atrás, a equipe santista entrou em campo para um amistoso contra a seleção Centro-Oeste da Nigéria, na cidade de Benin, e fez com que a guerra civil que se desenrolava a quase dois anos, parasse.


O jogo fez parte de excursão realizada pelo Peixe no continente Africano naquele ano. Ao todo foram disputados nove jogos com cinco vitórias, três empates e uma derrota contabilizadas para o time da baixada.

Entretanto, a partida que ficou marcada na história – deixando as outras oito em segundo plano – quase não aconteceu. Por medo dos militantes locais de possíveis manifestações hostis, em função dos confrontos que ocorriam entre nigerianos e separatistas do leste africano, a partida ficou fora do roteiro inicial da excursão pelo continente.

O clima no país era de grande tensão causada por esses conflitos entre as tropas nigerianas e os separatistas, que queriam a criação de um país chamado Biafra. O ex-jogador Edu, que estava entre os titulares da partida, exemplificou a hostilidade na região. “Eu perguntei para o gerente do hotel porque que as luzes da cidade estavam apagadas, e ele disse que era para dificultar a visão do inimigo”, contou durante entrevista em 2011.


Mesmo assim, o prestígio que Pelé usufruía - já tinha duas libertadores, dois mundiais interclubes além das duas primeiras Copas do Mundo pelo Brasil, em 58, na Suécia, e 62, no Chile – foi determinante para que o então governador da região nigeriana, coronel Samuel Ogbemudia, decretasse aquele dia como feriado e, conseqüentemente, cessar fogo entre as tropas adversárias.

Com isso, todos puderam assistir a vitória santista por 2x1 (gols de Edu e Negreiros) que entrou para o imaginário do torcedor santista e é, até hoje, passado de boca em boca para as gerações mais novas.

Ter uma sala repleta de troféus e títulos no currículo não é um privilégio exclusivo do Santos. Mas fazer com que um conflito armado pare, mesmo que apenas por algumas horas, para ver uma partida de futebol, é um orgulho que apenas aqueles homens puderam sentir.


Naquele dia, Gilmar, Laércio, Turcão, Ramos Delgado, Joel Camargo, Rildo, Oberdã, Lima, Negreiros, Marçal, Mané Maria, Toninho, Douglas, Pelé, Amauri, Edu e Abel ganharam uma batalha que vai além daquela disputada entre as quatro linhas.

Naquele dia, esses homens vestidos de branco, a cor da paz, ganharam da violência, da injustiça social e da miséria. Uma verdadeira goleada.